quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Para não esquecer

Se eu hesitar em uma esquina de Buenos Aires

Tentando segurar as lembranças nas mãos

Pacotes mal amarrados

Trens em velocidade zero onde já não entro

Se o vento frio do rio de leite me segurar a manga

A manga, que engraçado a mesma e diferente manga

Será possível, será dormindo

Será contigo em uma foto com os pezinhos para cima

Se eu tomar um choque em plena Avenida de Mayo

Em frente ao London, discutindo prêmios

Será apenas a tua mão que me atingiu, que me envolveu

Que me devolveu ao centro e me trouxe a outro bairro

E se for enfim um tango em Porto Alegre

Será Porto Alegre, então, será preciso

Será desperto

Será tranqüilo

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Resposta ao livro das respostas

Caro amigo, obrigado pelo comentário. Obviamente tu és uma das grandes exceções: tu tens curiosidade e não desprezo pelo diferente, como a maioria dos meus melhores amigos. Entendo teu comentário sobre o racismo, mas não devemos esquecer uma coisa bem clara e brutal: os negros estão em grande desvantagem inicial, sim. Por mais que tentemos relativizar dizendo que todos somos preconceituosos e tal, isso não muda o fato concreto. Pior: corremos o risco de tentar escondê-lo e tornar o preconceito justificado por ser algo “natural” e comum a todos. Não vamos cair nesta armadilha. Não queremos ser nem condescendentes nem cínicos.

Quanto á amostragem de minha análise (papinho científico, hein?) fica assim: classes média e alta de Porto Alegre, além de universitários vindos do interior, que é com o que mais convivo. Devo confessar uma coisa: as pessoas de classe baixa com quem tive contato tendem a ser bem mais simpáticas e menos arrogantes, como em qualquer lugar do país. Como no Guamá. Queria conviver mais com este meio, que afinal é de onde venho.

Sabe do que sinto falta? De conhecer a mítica Satolep melhor. De conhecer a fronteira, o Pampa profundo. De ampliar meu olhar, como tu sugeriste. Que tal juntarmos uma galera e fazermos essa descoberta juntos? Tipo “Eu indo ao Pampa, o Pampa indo em mim”. Ampliar o olhar é comigo mesmo, é meu esporte preferido.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Sobre civilidade e truculência em Belém


Já escrevi sobre Porto Alegre, talvez seja a hora de colocar Belém em foco. Nossos problemas, nossos acertos, com o olhar enviesado que quem já não tem a presença física da cidade, mas a leva sempre no peito.

A princípio me parece que nos falta um certo cuidado com a cidade, uma vontade maior de deixá-la bonita e arrumada, de achar um horror um papel de chiclete jogado ao chão. Estamos melhorando, eu acompanho pela internet. Temos vários lugares bonitos, mas ainda temos muitas ruas mal cuidadas, um crime em uma cidade potencialmente tão bela.

Somos dispersos, e o calor não ajuda nem um pouco. Vivendo aqui no sul as quatro estações percebo como o calor faz mal para o pensamento e para a concentração. A atividade intelectual fica mais difícil, pesada, requer uma disciplina ferrenha. O frio acelera o pensamento, disciplina o olhar, concentra a energia. Ter bom senso em um clima quente como o de Belém é ser um herói, um guerreiro.

Então somos dispersos, mas qualquer um seria nestas condições. Somos atrasados, temos o espontaneísmo do brasileiro médio, ficamos melhores amigos ao primeiro contato. (Credo, e eu estranhando isso tudo!). Não temos a necessária aversão ao populismo e ao coronelismo. Permitimos que no interior do estado haja trabalho escravo, impunidade, todo tipo de horror e injustiça. Até para a esquerda ganhar eleição tem que pedir benção ao sinhozinho grande.

Deixamos um de nossos maiores intelectuais ser perseguido na justiça e agredido fisicamente apenas por ter uma opinião sólida e divergente sobre as coisas. Não fazemos muita questão de democracia nem de opiniões divergentes. Somos truculentos, rebarbados, grossos. Em algum momento do século XX perdemos nosso refinamento afrancesado, nosso charme de grande metrópole da Amazônia, nossas luzes na floresta. Perdemos muito de nossa delicadeza, criamos o mito da “terra do já teve”. A integridade física, intelectual e legal de Lúcio Flávio Pinto dará a medida de quanto ainda somos civilizados ou de quanto cedemos à brutalidade.

E paradoxalmente há tantas coisas belas, belas, tantas Eneidas e mangueiras, tanta musicalidade e intensidade, tanta poesia. A chuva - em Belém, e só lá, eu gosto da chuva. Banho de cheiro, corda do Círio, tacacá. A pujança metafísica do bolo de macaxeira, o arraial do Pavulagem, a visceralidade dos sucos de taberebá, muruci e cupuaçu. Tanta coisa, que não cabe em apenas um post.

Meu futebol


Eu, como a maioria dos brasileiros, adoro cerveja, mulher e futebol. Mas tudo do meu jeito. Gosto de cerveja escura e encorpada, não da água fraquinha que as pessoas preferem. Não suporto mulheres “gostosas e burras” estilo programa de humor antiquado, e em futebol não consigo me empolgar com clássicos locais. Remo ou Paysandú, tenho mesmo que escolher e endeusar um, e odiar mortalmente o outro? Pergunta retórica e idiota para a maioria, eu sei, mas é assim que eu sou. Eu sou os dois, um híbrido esquizofrênico talvez, mas muito eu. Que me importa o Gre-nal, o bom mesmo é ver o Grêmio ganhar do Corinthians, do River. Quanto maior a dimensão geográfica da partida, mais me interessa. Uma cidade apenas é pouco para mim.

Isto posto, é com tristeza e não com ironia que vejo o Remo ameaçado de eliminação na série C. Nosso pobre, corrupto e bagunçado futebol paraense, que já viu dias muito melhores, se arrasta melancolicamente tentando se reerguer. Conseguiremos?