terça-feira, 8 de julho de 2008

Minha Itália


Morar no Rio Grande do Sul é necessariamente repensar a Itália nossa. Para um brasileiro padrão e para boa parte do mundo a Itália é uma terra latina, passional, terra de artistas, inventores, gente extrovertida e comunicativa. Gente como o sonhador e desvairado Fellini, o refinado e contundente Lampedusa, o inigualável Ítalo Calvino, sem falar em todos os mestres da renascença e tantos outros que nos últimos oitocentos anos ajudaram a tornar o mundo um lugar mais inteligente, interessante e criativo para se viver.

Pois a Itália daqui não é nada disso. Ser “italiano” aqui é quase sinônimo de ser provinciano. É viver sob uma “ética do trabalho” que dispensa o pensamento que não sirva à produção e acha que arte e filosofia são coisa de gente desocupada e nociva à sociedade. É ser Weberiano sem ser protestante nem precisar ler livro algum, e nem sequer imaginar quem é Weber. É sentir desprezo por essa gente “preguiçosa” e de pele escura que eles chamam de modo excludente de “brasileiro”.

Racismo e sensação de superioridade em relação aos de pele escura não é privilégio deles, é moeda corrente em todo o mundo ocidental, inclusive na verdadeira Itália. O diferencial dos pretensos italianos do sul é que eles ignoram o outro lado: o da criatividade, da racionalidade, da grande contribuição que a verdadeira Itália sempre deu ao mundo civilizado. A minha Itália não é uma terra de agricultores provincianos e racistas. A minha Itália é uma terra de luzes, de Leonardo da Vinci, de Michelangelo, de Umberto Eco, Antonioni, Vittorio de Sica... Uma terra que pode até eleger um Berlusconi ou acumular lixo nas ruas de uma das principais cidades, mas uma terra de gente com idéias, com atitude, gente que é parte de tudo o que de melhor a humanidade já produziu.

Para não parecer tão amargo nem tão pesado, vamos dar crédito às coisas boas de nossa pseudo-Itália sulista. Eles trouxeram ao país a bela tradição do vinho, a comida maravilhosa e o melhor suco de uva do mundo. Bem que podiam ter trazido também a verve poético-anarquista-humanista que tanto caracterizou a Itália historicamente.

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