segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Sobre civilidade e truculência em Belém


Já escrevi sobre Porto Alegre, talvez seja a hora de colocar Belém em foco. Nossos problemas, nossos acertos, com o olhar enviesado que quem já não tem a presença física da cidade, mas a leva sempre no peito.

A princípio me parece que nos falta um certo cuidado com a cidade, uma vontade maior de deixá-la bonita e arrumada, de achar um horror um papel de chiclete jogado ao chão. Estamos melhorando, eu acompanho pela internet. Temos vários lugares bonitos, mas ainda temos muitas ruas mal cuidadas, um crime em uma cidade potencialmente tão bela.

Somos dispersos, e o calor não ajuda nem um pouco. Vivendo aqui no sul as quatro estações percebo como o calor faz mal para o pensamento e para a concentração. A atividade intelectual fica mais difícil, pesada, requer uma disciplina ferrenha. O frio acelera o pensamento, disciplina o olhar, concentra a energia. Ter bom senso em um clima quente como o de Belém é ser um herói, um guerreiro.

Então somos dispersos, mas qualquer um seria nestas condições. Somos atrasados, temos o espontaneísmo do brasileiro médio, ficamos melhores amigos ao primeiro contato. (Credo, e eu estranhando isso tudo!). Não temos a necessária aversão ao populismo e ao coronelismo. Permitimos que no interior do estado haja trabalho escravo, impunidade, todo tipo de horror e injustiça. Até para a esquerda ganhar eleição tem que pedir benção ao sinhozinho grande.

Deixamos um de nossos maiores intelectuais ser perseguido na justiça e agredido fisicamente apenas por ter uma opinião sólida e divergente sobre as coisas. Não fazemos muita questão de democracia nem de opiniões divergentes. Somos truculentos, rebarbados, grossos. Em algum momento do século XX perdemos nosso refinamento afrancesado, nosso charme de grande metrópole da Amazônia, nossas luzes na floresta. Perdemos muito de nossa delicadeza, criamos o mito da “terra do já teve”. A integridade física, intelectual e legal de Lúcio Flávio Pinto dará a medida de quanto ainda somos civilizados ou de quanto cedemos à brutalidade.

E paradoxalmente há tantas coisas belas, belas, tantas Eneidas e mangueiras, tanta musicalidade e intensidade, tanta poesia. A chuva - em Belém, e só lá, eu gosto da chuva. Banho de cheiro, corda do Círio, tacacá. A pujança metafísica do bolo de macaxeira, o arraial do Pavulagem, a visceralidade dos sucos de taberebá, muruci e cupuaçu. Tanta coisa, que não cabe em apenas um post.

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