segunda-feira, 15 de março de 2010

O rio do rock tem vários afluentes

E os anos 80, afinal? São uma década perdida e vazia para o rock, na qual os teclados brega deixaram as guitarras de lado? Uma década em que os cabelos esvoaçantes e as roupas coloridas só perdem em mau gosto para os emos de agora? Pretendo desenvolver aqui porque sim, e porque não acreditar nestas opiniões.
Sim: há muita coisa ruim, mal produzida, tanto no rock quanto na MPB da época. Muita coisa que odiávamos então, agora subitamente adquire um ar de cult só porque nos lembra a nossa adolescência. O tempo suaviza a amargura.
Não: há muita coisa visceral para o mundo do rock, ainda hoje influente. Algumas das melhores bandas dos anos 2000 como Strokes e Interpol têm seu som calcado nas coisas boas dos anos 80. Pixies, Smiths, Cure, U-2, R.E.M., entre tantos outros, ainda fazem tremer as caixas de som com guitarras, baixos e baterias que demonstram a continuidade do bom rock que vem desde os anos 60 e se insinua até hoje.
Falando em linha evolutiva: os anos 60, por maravilhosos que tenham sido, também geraram muita coisa brega e irritante. Idem para todas as outras décadas, e escolher gostar mais de uma ou outra é questão de recorte: meus anos 70 são a disco music, o progressivo, o glitter, a new wave ou o punk? Qual a conexão que desejo fazer com o meu presente?
Falando explicitamente: todas as décadas do nosso amado rock têm seus tesouros, seus clássicos e seu lixo. Algumas vezes o lixo alcança mais a mídia (a atual geração emo), outras vezes as jóias são atiradas em arena pública (Os Beatles sendo perseguidos por fãs histéricas), mas está tudo aí: misturado, fervilhando e pulsando, nosso adolescente de 60 anos que nasceu negro e americano, de mãe soul e pai blues, foi criança e adolescente na Inglaterra, já foi épico e anárquico, já pregou a paz, a psicodelia, a futilidade e a subversão, foi sacana e ingênuo, malandro e porralouca, sério e politicamente correto.
Os anos 80 não são apenas um buraco de efemeridade. São um braço de rio denso e rico, da grande corrente que desde os anos 50 tornou nosso mundo mais dinâmico e pulsante, e que se chama rock and roll.



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Um comentário:

Renato Torres disse...

Alan,

revi esses dias o ótimo "24 hours party people", filme do Winterbottom que diz muito de tudo o que nossa geração amou nos anos 80/90. é engraçado hoje ouvir adolescentes cantando canções dos Smiths, e ficar se perguntando se eles têm uma compreensão profunda da dor dessas canções como tínhamos à nossa própria adolescência... parabéns pelo texto, e vida longa ao Guamundo!

abraços,

r